Governo do Rio poderá cobrar de marketplace ICMS devido por lojistas

O Estado do Rio de Janeiro prepara, ainda para este ano, a publicação de dois decretos sobre a tributação de marketplaces. Um vai regulamentar a lei que responsabiliza essas empresas e intermediadores financeiros pelo pagamento do ICMS devido por lojistas que comercializam produtos nessas plataformas de venda on-line. O outro será direcionado aos centros de distribuição.

Será o primeiro ato da Secretaria de Fazenda para começar a aplicar a Lei nº 8.795, de 2020, validada pelo Órgão Especial do Tribunal de Justiça (TJRJ) no mês de agosto. Há estimativa de arrecadação adicional, a médio prazo, de R$ 3 bilhões a R$ 5 bilhões.

Com a regulamentação, diz o Estado, a fiscalização terá o amparo legal necessário para combater a sonegação e a concorrência desleal, evitando perda de empresas e empregos locais.

Os marketplaces disponibilizam seus sites para que terceiros anunciem e comercializem produtos. Em troca, recebem uma porcentagem do valor da venda. “É um shopping virtual, uma vitrine”, explica Rodrigo Petry, sócio do Almeida Advogados. Ele também coordena o Comitê Tributário da Câmara Brasileira da Economia Digital, que tem entre os associados Americanas, Mercado Livre e Magazine Luiza.

O movimento de responsabilização tributária começou em 2019, com a edição de leis na Bahia, Ceará e Paraíba. Em 2020, além do Rio de Janeiro, mais cinco Estados editaram normas nesse sentido: Maranhão, Mato Grosso, Paraná, Piauí e Rio Grande do Sul. No ano de 2021, Minas Gerais e Sergipe.

Antes, somente São Paulo tinha previsão sobre os marketplaces. Essas empresas podem ser responsabilizadas pela fazenda paulista se deixarem de apresentar as informações solicitadas. Seria uma “postura mais cooperativa”, em comparação com a lei do Rio, segundo advogados, para auxiliar na fiscalização dos lojistas.

Em geral, as normas estaduais têm formatos diferentes. A do Rio de Janeiro ganhou notoriedade por ser bastante ampla e, ainda assim, ter sido validada pelo Tribunal de Justiça do Estado, dizem os especialistas.

A Lei 8.795 prevê a responsabilização tanto de marketplaces como de intermediadores financeiros – credenciadora e/ou administradora de cartões de crédito e débito ou outros meios de pagamento.

Existem três hipóteses para a responsabilização tributária: se deixarem de prestar informações na forma e prazos previstos pelo Estado; quando o lojista estiver em situação irregular – deixou de emitir nota fiscal e/ou recolher o imposto -, o intermediador for comunicado pelo Fisco e, ainda assim, disponibilizar os seus serviços a esse lojista; e quando o próprio intermediador descumprir as demais obrigações previstas na lei e deixar de recolher o tributo.

O subsecretário adjunto da Secretaria de Fazenda do Rio de Janeiro, Thompson Lemos, diz que a regulamentação dessa lei será feita por etapas. O decreto previsto para este ano vai tratar só da primeira hipótese: a apresentação de informações por marketplaces e intermediadores financeiros.

Uma das possibilidades é dar mais força à Declaração de Informações de Meios de Pagamento (Dimp). “Já existe essa obrigação, mas ainda não está regulamentada de forma completa”, diz Lemos. “Precisamos assegurar que o contribuinte sentirá efetivamente que haverá consequências se não entregar.”

Ele acrescenta, além disso, que em São Paulo e Minas Gerais é exigida uma declaração dos lojistas que usam as plataformas de venda on-line. “Não gostaríamos de criar mais uma declaração, mas talvez seja necessário e até mais simples. Estamos conversando com o segmento”, diz.

Lemos destaca que a construção de um banco de dados, a partir da apresentação das informações pelos marketplaces e intermediadores de pagamento, permitirá ao Estado implementar a segunda etapa da regulamentação: informá-los quais lojistas estão em situação irregular.

Só a partir dessa segunda etapa os marketplaces e os intermediadores de pagamento poderão ser responsabilizados pelo ICMS devido por lojistas que não emitiram nota fiscal nem recolheram impostos.

Duas audiências públicas foram realizadas com o setor de marketplaces – a última delas na semana passada – e a Secretaria de Fazenda abriu canal para envio de sugestões.

Profissionais que atuam na área afirmam que, apesar de a decisão do TJRJ ter dado força à lei e permitido ao Estado seguir em frente com a regulamentação, as empresas continuam discordando. “Esse tema ainda deve ser julgado pelo Supremo Tribunal Federal”, diz o advogado Douglas Mota, do escritório Demarest.

Daniel Miotto, do escritório Gasparini, Nogueira de Lima e Barbosa Advogados, complementa que o julgamento do TJRJ se deu sob a perspectiva da Constituição Estadual e se os ministros do STF julgarem o tema, analisarão se há compatibilidade com a Constitucional Federal. “A legislação do Rio afronta diversos princípios. Essa matéria só poderia ter sido definida por lei complementar federal”, defende.

O outro decreto a ser publicado ainda este ano – direcionado aos centros de distribuição – tem outra base: o Ajuste Sinief nº 35, do Conselho Nacional de Política Fazendária (Confaz).

Essa norma estabelece as regras gerais que os Estados devem adotar sobre o armazenamento das mercadorias vendidas nas plataformas on-line. “Temos conhecimento de que grandes marketplaces, hoje, são também operadores logísticos”, diz o subsecretário adjunto da Secretaria de Fazenda.

O consumidor compra a mercadoria e o lojista envia para o “centro de distribuição” do marketplace, que faz a entrega. Sobre esse serviço de transporte, frisa Lemos, há incidência de ICMS. Se os marketplaces compram as mercadorias dos lojistas para revender, diz, o ICMS também é devido. “É um mercado complexo. Teremos que fazer essa outra regulamentação.”

Publicado por Valor Econômico