Aeroporto de Congonhas será privatizado hoje em leilão marcado pela falta de concorrência

A 7ª rodada de concessões de aeroportos, que inclui o cobiçado terminal paulistano de Congonhas, um dos mais movimentados e rentáveis do país, fará o Brasil ter um tráfego aéreo nas mãos da iniciativa privada superior a 90%. O leilão desta quinta-feira, porém, ocorre em meio a um cenário econômico de incertezas. Juros elevados, alta no custo das matérias-primas e insegurança em relação ao futuro do setor aéreo, ainda afetado pela pandemia de Covid-19, são elementos que estão no radar dos investidores.

Isso explica, segundo os analistas, a baixa concorrência pelos 15 terminais a serem oferecidos pelo governo federal no leilão, que será realizado às 14h.

Mesmo sendo apontado como a joia da Coroa do leilão, o aeroporto de Congonhas só recebeu uma proposta, do grupo espanhol Aena, segundo fontes. Sem disputa, deve ser arrematado pelo lance mínimo de R$ 740 milhões. Os investimentos totais previstos nos 15 aeroportos que serão licitados são de a R$ 7,3 bilhões.

— Com menos concorrência, o valor dos lances de outorga tende a ser mais baixo, o que afeta o total que vai ser arrecadado pelo governo federal — avalia o advogado Felipe Bonsenso, sócio da Bonsenso Advogados e especialista no setor aeronáutico.

Segundo o que o ministro da Infraestrutura, Marcelo Sampaio, escreveu em suas redes sociais, foram feitas propostas pelos três blocos que somam 15 aeroportos nas regiões Norte, Sudeste e Centro-Oeste.

O agrupamento dos terminais em lotes foi feito para evitar o chamado ‘leilão vazio’, ou seja, sem interessados. Congonhas será leiloado com mais dez aeroportos localizados em Minas Gerais, Mato Grosso do Sul e no Pará.

Gigantes fora do páreo

O fato de todos os blocos terem atraído interessados já é positivo, diz um especialista que vem acompanhando de perto a licitação, considerando que existem terminais deficitários incluídos nos blocos. Mas a surpresa é que operadoras de peso como a CCR e a Inframérica não participem da disputa por Congonhas.

O grupo espanhol Aena administra seis aeroportos no Nordeste, incluindo Recife e Maceió. Um consultor que acompanha os bastidores do certame afirma que ao confirmar seu lance a Aena ampliará sua participação no país, já que é forte apenas no Nordeste, depois que participou da 5ª rodada de concessão de aeroportos, realizada em 15 de março de 2019.

A empresa ganhou a concessão dos Aeroportos de Recife (PE), Maceió (AL), João Pessoa (PB), Campina Grande (PB), Aracaju (SE) e Juazeiro do Norte (CE). O valor pago foi de R$ 1,917 bilhão, um ágio de 1.010%. Os investimentos que estão sendo feitos nos seis aeroportos são de mais de R$ 1 bilhão.

Experiência com aeroportos menores

Para o especialista, a Aena já adquiriu experiência em operar terminais considerados “menos rentáveis” no país, como Campina Grande e Juazeiro do Norte. Na Espanha, a operadora administra 48 terminais e também tem experiência em aeroportos menores. Poderá reproduzir este modelo no Brasil, avalia o especialista.

No primeiro semestre deste ano, a Aena teve um lucro de €163,7 milhões frente a perdas de € 346,4 milhões no mesmo período de 2021, conforme reportado pela empresa à Comissão Nacional do Mercado de Valores Mobiliários (CNMV).

desistência da CCR, que já opera o aeroporto de Confins, em Minas Gerais, e foi a grande vencedora da 6ª rodada de concessões de aeroportos ao arrematar 15 terminais, foi considerada inesperada. A empresa sempre declarou que tinha interesse na 7ª rodada de concessão e especialmente em Congonhas, que só fica atrás em movimento do terminal de Guarulhos, também em São Paulo.

Lance mínimo

Pesou o fato de a empresa ter arrematado muitos terminais na última rodada e já saber a dificuldade de operar terminais pequenos no país, diz uma fonte a par das ofertas e que prefere não se identificar.

Maysa Abrahão Tavares Verzola, sócia da área de Contencioso, Arbitragem e Direito Público do escritório Gasparini, Nogueira de Lima e Barbosa Advogados, observa que a inclusão de Congonhas em bloco de aeroportos menos rentáveis, embora louvável do ponto de vista do interesse público, acaba resultando em pouca competitividade na licitação.

– O modelo de licitações em bloco segue o de rodadas anteriores, mas a heterogeidade do bloco SP/MS/PA/MG acabou por afastar o interesse de grandes operadores mesmo contendo a “joia da Coroa”. Por conta disso, é provável que as concessões sejam arrematadas pelo lance mínimo – diz a advogada.

Também a Inframérica, fruto da união da Infravix Empreendimentos S/A, empresa controlada pelo Grupo Engevix, com a Corporación América S/A, empresa argentina de concessões aeroportuárias, ficará de fora do leilão. A empresa opera o aeroporto de Brasília. Considerada conservadora, a empresa não estaria disposta a operar tantos terminais, incluindo os deficitários, diz a mesma fonte.

Os outros dois blocos são o Norte, que inclui os aeroportos de Belém e Macapá, e o terceiro lote foi destinado à aviação executiva, incluindo o Campo de Marte (em São Paulo) e Jacarepaguá (no Rio).

XP vai entrar no setor de aviação

Outra surpresa do certame, segundo especialistas, é a entrada da XP no setor de aeroportos. A empresa fez a única proposta, em parceria com a francesa Egis, pelo lote da aviação executiva.

No leilão, vence quem oferecer o maior valor de outorga fixa para cada lote. Além desse pagamento, os concessionários vencedores deverão desembolsar outorgas variáveis ao longo dos 30 anos de contrato. O governo elevou o percentual de outorga variável de 5% para 16%, o que ajudou a reduzir o valor da outorga mínima fixa.

Terminal VIP do aeroporto de Guarulhos

Local terá tarifas iniciais de US$ 150 por chegada e US$ 250 por partida

Segundo o Programa de Parcerias e Investimentos, no bloco liderado por Congonhas, a outorga mínima foi definida em R$ 740 milhões. Ao todo, estão previstos investimentos de R$ 5,9 bilhões no lote.

No bloco Norte, o valor mínimo da outorga é de R$ 56,9 milhões, e os investimentos foram projetados em R$ 875 milhões. Já no lote de aviação executiva, a outorga mínima é de R$ 141 milhões, e os investimentos previstos somam R$ 552 milhões.

Leilão do Santos Dumont em 2023

O Aeroporto Santos Dumont (RJ) integraria originalmente esta rodada de concessões, num bloco junto aos aeroportos de Minas Gerais, mas ficou de fora e deve ser leiloado apenas em 2024. Depois da decisão, os blocos foram reorganizados com os aeroportos mineiros juntando-se ao bloco mais lucrativo que tem Congonhas.

Ao todo, os aeroportos da sétima rodada somaram 30 milhões de embarques e desembarques em 2019, portanto antes da pandemia, segundo a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac). Esse número equivale a 15,8% do total do tráfego de passageiros do país, segundo a Anac. Só Congonhas movimentou 22 milhões de passageiros naquele ano.

Entre 2011 e 2021, o programa de concessão aeroportuária no Brasil concedeu o equivalente a 77,5% do tráfego nacional à iniciativa privada. Somado à 7ª rodada, esse percentual atingirá 91,6%.